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Eu, Martinho. (Arte: Yhuri Cruz) |
Martinho da Vila - Disritmia
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João encarava seus olhos marrons, brilhantes, pequenas lagoas de coca-cola banhada à luz do sol, poças do whisky mais dourado que ele já vira seu pai bebendo. Eles, sentados em dois banquinhos de madeira, sem apoio para as costas, se apoiavam na mesa redonda, decorada com machetaria que formava desenhos de estrelas, e pequenas repetições geométricas ao redor. Era um barzinho da zona sul do Rio de Janeiro que tinha estilo boêmio, repleto de violas, cavaquinhos, letreiros de cervejas grudados às paredes revestidas de madeira cor de tabaco. Os tímpanos ressoavam ao som de samba de raiz, Martinho, Zeca, Caymmi, Cartola, Adoniram, Leci. O bar estava lotado, mas não se escutava vozes estridentes ou risadas alvoroçadas. Era quarta-feira e os consumidores de cerveja e de petiscos pareciam cansados, falavam com os olhos e raras vezes com os lábios, os pés se mexiam com o batuque que ressoava até duas esquinas depois do local originário, os cabelos esvoaçavam com o vento da enseada e os barulhos de copos, talheres e espetinhos faziam parte da composição dos sambas.
João e Camille estavam a conversar sobre o tudo e o sobretudo, sobre o clima e 'o' clima, sobre a noite e à noite. A nova trilha levou o assunto anterior à confissão de João: "Que disritmia que eu sinto quando ouço 'Disritmia', do Martinho da Vila". Ela lhe ofereceu um sorriso amplo, cheio de dentes e lhe perguntou a razão de tal afirmação. Em seu íntimo, Camille adorava descobrir as sutilezas de certos fenômenos no comportamento do ser humano. Ele lhe explicou que Martinho conseguiu captar a essência de um homem apaixonado e carente de afeto, mas sem amplificar necessariamente nem a paixão nem a carência. Ele escreveu o homem que quer ao mesmo tempo se esconder da vida, mas ser encontrado por um amor, ser fotografado pela retina de sua musa. Quer dar-lhe cafuné, a cubrir de dengo, e deslanchar num amor atemporal, um amor hipnótico, sem razão de ser e de não ser. Quer ser ouvido em suas teorias e desejos de vida por alguém que não o ache um romântico inveterado, mas um homem em seu momento romântico.
Seus olhos brilhavam, Camille e João, e não se pronunciava uma palavra. Uma lágrima sem volume surgiu nos olhos de João, fazendo com que ele se contraísse e ficasse cabisbaixo. Ele culpou seu inconsciente de permitir que aquilo acontecesse em frente a Camille e permaneceu calado. Ouviu a voz da mulher: "É isso que você precisa de mim, João?". Camille posicionou o refletor da dúvida sobre a pessoa de João. E sob a camisa, sob o peito, sob a pele, sob os músculos, ouvia-se a sinfonia desregrada daquele coração confuso.
Martinho da Vila apareceu ao seu lado e lhe deu um tapa nos ouvidos. João, então, cantou: "Me deixe hipnotizado prá acabar de vez, com essa disritmia. Vem logo! Vem curar teu nego, que chegou de porre lá da boemia!". Camille e João se beijaram e a música terminou sem um fim.

É notório como você escreve e o que você escreve. Isso é muito bom, nunca fuja dessa identidade, mas como falei, está muito repetitivo e previsível. Acho que um bom escritor pra mim é aquele que fala de tudo sem perder a sua identidade. Misture a realidade "verídica" em seus textos,tenho certeza que seus textos terão mais sustentação causando uma sensação de segurança pro leitor e a compreensão inconsequentemente será ainda melhor! MAs nunca esqueça da sua identidade,ou melhor dizer, da sua essência :p ...( e vc ainda acha que ela não existe rsrsrs)
ResponderExcluirMeu blog está vindo ae! me aguarde! hehehe
ResponderExcluirFinalmente você começou a ler de fato os textos que eu escrevo. Fico feliz por estar mais crítica em relação a certas coisas.
ResponderExcluirEsclarecimento: minha literatura vive de coisas que eu vivo ou vejo pessoas vivendo. Cada frase que eu escrevo é real e verídica. A minha realidade, você conhece muito bem, é repleta de sonhos, mundos e personagens que talvez nunca apareçam em carne e osso para nenhum dos leitores, mas me rodeiam o tempo todo.
Quando você for criticar, tenha noção que nenhum dos meus textos tem qualquer pretensão de ser mais uma reportagem jornalística. São contos, ou seja, sucintos, precisos e, muitas vezes, fantasiosos.
Quanto a essencia e a verdade, cada dia percebo que elas realmente existem, mas sou o tipo de pessoa que espera que elas desapareçam.
Aguardo seu blog! \o/
Curti o texto e a análise da música, ainda não tinha me tocado do porquê gosto dela.
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