terça-feira, 23 de outubro de 2012

Corpo em tinta.


Traumas, Yhuri Cruz.
(Tinta à Óleo)
eu pinto o que há em mim.
e existem tantas coisas que eu não consigo transmitir.
nuances, sombras, luzes.
o que mais me excita na pintura não é a mensagem, mas a materialidade da tinta.
essa materialidade meio-sólida meio-líquida é o que me define como eu (como artista).
minhas pinturas, por mais modestas que sejam, devem ter textura de tinta.
é algo que eu propus a mim mesmo, a textura é o que me representa.
a materialidade, a concretude das cores.
o meu desejo dramático de me transportar de corpo e alma para dentro de cada tela.



quinta-feira, 4 de outubro de 2012

A Massa de Pizza.

Numa noite de primavera um grupo de pessoas seguia o caminho para casa dentro de um ônibus. Todos os bancos ocupados e poucos espaços livres no estreito corredor. Todos balançavam juntos, saltavam juntos, freavam juntos: como uma grande massa de pizza sendo preparada. Uma massa calada.

Ouve-se uma gritaria na frente do ônibus. Um homem reclama com o motorista. O condutor não havia parado no ponto, mas sim, muitos metros a frente, e o homem, já de idade, teve de correr atrás do ônibus, ofegante. Enquanto o passageiro revoltado dizia seus desabafos ao motorista, o silêncio do ônibus transformou-se em um grande cochichar, sútil, sem vozes altas. 

O homem não parava de esbravejar o quão revoltante era aquela situação. "Se não gosta de trabalhar, de pegar passageiro, mude de emprego!", dizia. 

O cochicho coletivo perdeu lugar para o silêncio em poucos minutos. A única voz restante era a do homem, que se sentia injustiçado e profundamente sozinho.

Aquele ruído contínuo de revolta gerou um incômodo e um novo cochichar surgiu. Olhares e caras feias eram trocadas no ambiente. Até que o ônibus parou e praticamente todos os passageiros indicaram, com os mais de 70 dedos, a porta traseira, de saída, para o homem. 

O homem desce do ônibus espantado. O ônibus segue seu caminho. Em silêncio.