quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Quilômetros entre corpos, centímetros entre corações.

O cenário mudou de repente. Foi numa quarta-feira que ela se foi para o interior do estado e me deixou numa aparente solidão. O que nos separa agora é uma viagem de trem, 55 minutos. Antes, somente 15 minutos à pé. Na tarde em que ela partiu eu senti que o ar entre a gente aumentava pouco a pouco, quilômetro a quilômetro.

Era diferente. Ainda que eu não a visse todos os dias da semana, gostava de pensar que ela estava ali. Na distancia de 10 minutos de corrida. Me sentia aquecido pela sua proximidade. Era confortável ter o seu amor ao alcance. Me sentia forte por mim e para ela. A qualquer momento que precisasse de mim, eu poderia estar lá. Agora, não mais.

Essa angústia diminuiu dentro de mim quando, no último fim de semana, fui conhecer seu novo lar, e percebi o quanto uma nova casa pode transformar uma pessoa. Foi um fim de semana memorável e cheio de amor. O lado bom da distancia é a saudade. O melhor é quando surpreendemo-nos pela tsunami de amor e carinho que o tempo e a distancia nos proporciona ao rever os olhos e a pele da pessoa amada.

Toda relação se inicia continuamente conforme o ambiente muda. Eu estou vivendo um novo cenário. Um cenário nem melhor nem pior. Apenas complexo o bastante para ser vivido calmamente e com muita paciência. Os quilômetros nem sempre separam as pessoas. Pelo contrário, eles agem contra a própria natureza distanciadora, tornando-se aproximadores do coração. Esse é o efeito colateral da mudança para aqueles que se amam: enquanto os corpos sentem a distancia, o coração só converge para uma explosão de alegria no reencontro.

Ainda assim, preferia você aqui. Perto de mim. Mas eu sobrevivo.

Pensante.

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sábado, 16 de outubro de 2010

Merda.

É fácil pensar que tudo vai ficar melhor quando as aparências nos mostram tal coisa.
É difícil pensar que tudo vai dar errado quando você se esforça ao máximo para que dê certo.
É estranho pensar que depois de um dia bom possa vir um dia ruim.
É complexo entender que a vida é uma roda gigante, tem seus altos e baixos.

É insuportável ser alvo das decepções da vida.
Sem erudição, é uma verdadeira merda.

Pensante.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Alívio Turquesa.

Ela estava dentro d'água. Revestida pelo azul do mar e, embaixo de seus pés, a areia branca refletia a luz do sol juntamente com a limpidez da água salgada da praia deserta. Os reflexos eram tão intensos que tudo parecia salpicado de diamantes.

Tudo era turquesa. O céu, o mar, seus olhos e sua paz de espírito. Ela estava feliz de estar viva e feliz de poder estar ali. Era o momento de alívio que tanto buscava após as batalhas diárias contra o mundo, interior e exterior. Para ela, estar naquela água, mergulhada em paz, era, de longe, o melhor momento de sua vida.

A liberdade só pode ser sentida quando o ambiente é assim, suave e envolvente. Nunca repressivo.

Cada tomada de ar significava um sentimento. Ela tinha um fôlego de sereia. Não precisava respirar tanto. Mas quando inspirava, sentia a alegria entrar pelas narinas e enriquecer seu corpo com oxigênio que ansiava: felicidade. Quando expirava, soltava todo tipo de mágoa que continha dentro do coração, o grande pulmão da alma.

Depois de tanta luta para chegar na praia, ela só quer curtir o balanço e o aconchego do mar.

E na hora de ir embora, quando o sol se pôr e dourar o oceano, ela terá certeza de que o ultimo fôlego de alegria vai perdurar. Porque, ainda que o dia tenha acabado, terá seu pequeno nebulizador de alegria portátil: os beijos da pessoa que ama.

Ela não sabe se será eterno. Mas sabe que, no momento, é.
Pensante.

sábado, 9 de outubro de 2010

Esqueça o fim. Aprecie a paisagem.


Existem aqueles que acreditam que tudo caminha para um destino apocalíptico. Por outro lado, existem aqueles que acreditam que rumamos o caminho para a utopia.

A verdade é que tudo caminha para o fim, bom ou ruim. Eu, você e tudo ao seu redor. Tudo vai acabar desligado da realidade. Tudo vai ser enterrado qualquer hora.

Seja o seu corpo, seja o corpo da pessoa que ama, seja o corpo daqueles que você despreza. Todos acabarão num mesmo lugar. Na terra, no fim.

Os sentimentos não são eternos. Os abraços, os beijos, tudo vai se perder na memória desmemoriada do mundo. Tudo pelo que lutamos acabará quando fecharmos os olhos em meia-lua.

E o pior, não podemos levar nada para o término dos nossos respectivos tempos. É a desconexão que nos leva à formatação do nosso eu real.

O que vale mesmo é o começo e o meio. É o viver. É o caminho. Por isso que digo: a vida é feita para se viver, intensamente ou lentamente, a velocidade não importa. O que importa mesmo é a paisagem.




O Pensante.

domingo, 3 de outubro de 2010

Dedos queimados.

João acordou, mas parecia continuar a dormir naquele dia. Normalmente acordava com mais energia e disposição para encarar a vida. Hoje ele tinha preguiça e fraqueza de vontade de continuar respirando. No entanto, continuou andando, algo o empurrava. Foi ao banheiro, depois à cozinha. Deu de cara com seu irmão tomando café da manhã, sua mãe pilotando o fogão e seu pai lendo o jornal. Todos tinham sorrisos amarelos e olhares elétricos.  Um 'bom dia' e começou a tomar seu café. Algo acontecera no fogão e uma labareda de fogo subiu até o teto, foi uma sorte da mãe ter saído da beira do fogão a tempo. O fogo azul alaranjado queimou a cortina da janela e se alastrou rapidamente para o pequeno armário que guardava c óleo e temperos para a comida. João não sentiu vontade de levantar e correr ou de apagar o fogo, ficou apreciando sua beleza e seu poder, vendo sua mãe, pai e irmão se desesperarem. Um minuto, e a casa toda estava em chamas, todas as fotografias, todas as roupas de cama, tapetes, objetos eletrônicos, tudo estava cedendo a supremacia do fogo. Inexplicavelmente, João começou a sentir uma alegria o invadir. Ria feliz vendo tudo queimar: sua familia, sua casa, suas lembranças, sua vida. Sua pele brilhava, sua dor estava queimando e sua alegria fervendo. 'Enfim, estou livre', pensou.

Abriu os olhos e saiu da cama, suava um pouco. Estava com energia. Foi ao banheiro, depois à cozinha. Seu irmão tomava café, sua mãe pilotava o fogão e seu pai lia o jornal. Ficou uns bons minutos apreciando o gás que enroscava a faísca, causando a alegria da combustão, consumindo todo o prazer em fogo. As chamas gemiam para João. 'Venha ser livre...'. João refletiu, levantou, pôs a mão no meio das chamas e sentiu a dor insuportável.

'Duvido que a liberdade possa ser tão dolorosa assim.', pensou. E chorou, entre a dor e o remorso.

Pensante_