sábado, 6 de novembro de 2010

A chamada do paraíso.

Naquela sexta-feira, dia 8 de julho de 2004, eu estava na casa dos meus avós. Era uma casa incrivelmente antiga e diferente. Acredito que minha bisavó, Carminha, tenha a deixado para minha vó, Léa. A casa tinha um ar imperial. Era grande, com a fachada branca, diversas pilastras, e portas muito maiores das que nós vemos atualmente.

A familia Pinheiro Silva estava toda reunida para relembrar os 10 anos de morte do meu avô, João - conhecido como "Jota". Essa era uma tradição da familia: a cada 10 anos de morte de algum ente querido, nos reuníamos para relembrar, para reavivar sua memória em festa.

A família Pinheiro Silva acredita que o amor é eterno e que lembrar com alegria a pessoa que já se foi, é um ritual que tem como objetivo, não só transmitir a saudade que sentimos, mas também agradar aos falecidos juntando toda a família.

Naquele dia, todas as mulheres estavam na grande cozinha azul da minha avó e os homens, conversavam no grande salão. Eu ainda tinha 14 anos e não achava muito divertido ficar ouvindo as conversas malandras dos garanhões da familia, e muito menos as conversas de negócio e política dos mais velhos. Fui para cozinha, mas não achei entretenimento algum ao ouvir as mães, tias e primas fofocando a vida alheia, ainda que tenha ouvido algumas coisas interessantes. Acho que minha tia Cláudia está grávida, mas ainda não disse para o meu tio.

Em seguida, resolvi passear um pouco pelo casarão. Me sentia em outra época, uma época que nunca vivi, mas que leio constantemente nos livros de história. A época dos cavalos, dos imperadores, do "vós mecê", dos escravos. 

De repente ouvi um telefone tocar...TRIMMM, TRIMMM ... Botei as mãos nos bolsos, mas não tinha trago o meu celular comigo. O telefone continuava a soar. Seguindo o som, entrei num quarto estranhamente familiar. Acho que já tinha estado ali, era o quarto de ferramentas e outras bugigangas do meu avô. Lembrei que brincava bastante ali quando meu avô ainda era vivo. Eram memórias enevoadas: só lembro nuances, silhuetas e sorrisos. 

O telefone, que estava num móvel ao lado de uma cadeira antiga, tocava.. TRIMMM TRIMMM ... Era um telefone antiqüíssimo, grande, marrom e dourado.Cheguei perto e me assustei quando vi que o telefone não possuía fiação alguma. Tocava por si só, sem nenhuma energia elétrica em suas veias. Ele tocou mais uma vez, mas em um volume estrondoso! TRIIIIIIIIIMMMMM! ! !

Saí correndo rapidamente dali e tropecei no corredor que dava para o grande salão. Meus primos garanhões riram e zoaram da minha cara de medo. Passado algum tempo, cheguei um pouco perto do quarto novamente mas não ouvi som algum. Não ousei entrar no quarto. Mas acredite, não tinha sonhado, eu podia sentir as vibrações sonoras nos meus ouvidos alguns minutos atrás.

Já faz seis anos que isso aconteceu, e, ainda que eu não o tenha atendido, eu nunca vou esquecer o dia em que meu avô tentou me ligar do paraíso.

Do pensante.

Um comentário:

  1. Ah, que bonito Yhuri!
    Acho legal esses textos que falam de experiencias pessoais e familiares, pois pra mim parecem muito mais intimistas do que outros textos.
    E obrigada pelo comentário no meu blog!

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